quinta-feira, 21 de novembro de 2013

POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS REUNIDOS NA III CONAPPIR

Evento teve como objetivo reafirmar e ampliar o compromisso com políticas de enfrentamento ao racismo e promoção da igualdade




Cerca de 1400 pessoas participaram de um amplo debate em torno do tema “Democracia e desenvolvimento sem racismo: por um Brasil afirmativo” na III Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial (III CONAPIR), que aconteceu de 05 a 07 de novembro, em Brasília (DF). O evento teve como principal objetivo reafirmar e ampliar o compromisso do governo e da sociedade brasileira com políticas de enfrentamento ao racismo e de promoção da igualdade como fatores essenciais à democracia plena e ao desenvolvimento com justiça social no país.

Plenária de Abertura
A solenidade de abertura no dia 05 teve a presença da presidente Dilma Rousseff, ministros e convidados que representaram a diversidade étnico-racial brasileira, durante os demais dias até o encerramento da III CONAPIR foram realizados debates em torno da política e das necessidades e especificidades de cada grupo, todo o evento foi transmitido ao vivo por diversos veículos de informações e pelo site do evento, no qual também poderão ser conferidas entrevistas de participantes, fotos, matérias e vídeos. As atualizações ainda estarão disponíveis nas redes sociais da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial no Twitter e Facebook.

Presidente Dilma Roussef e a Ministra Luiza Bairros

Nos três dias de Conferência, a missão dos(as) participantes foram de apontar caminhos para a construção de um Brasil afirmativo, que considere a importância da inclusão racial nos processos de democratização e desenvolvimento do país. O debate se deu numa conjuntura favorável, com acúmulo de conquistas políticas, econômicas e sociais para o segmento negro que, pela primeira vez representa oficialmente mais da metade da população (50,7%) por autodeclaração, no último Censo do IBGE (2010).

Senadora Ana Rita - Presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos e Fábio Gomes

Destaca-se a importância do seguimento dos Povos e Comunidades Tradicionais, sobretudo dos Povos de Terreiros, que tiveram uma grande participação e deram valiosas contribuições aos debates e instrumentos elaborados e deliberados em plenárias.  O Povo de Terreiro, no dia 06, ocupou o Senado Federal, durante plenária realizada pela Comissão Nacional de Direitos Humanos do Senado, para reivindicar direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais.

Plenária na Comissão Nacional de Direitos Humanos do Senado Federal
Senador Magno Malta e Representante Juvenil Fábio Gomes

A Juventude de Terreiro, também se reuniu para pensar estratégias de enfrentamento ao racismo, combate a violência a juventude negra e empoderamento deste seguimento, presente em todos os estados brasileiros. A Juventude de Terreiro, ainda sofre com a intolerância religiosa, com a falta do cumprimento de instrumentos legais (sobretudo a Lei 10.639/2007).

Juventude de Terreiro reunida na III CONAPPIR, redigindo Carta de Participação

Existe uma lacuna em diversos setores da política nacional onde a juventude poderia está exercendo o controle social, por isso é notório a ausência de representatividade deste seguimento nos espaços de definições políticas, afim de criar soluções, ações afirmativas específicas e políticos públicos eficientes que incidam na vida social dos povos de terreiros em municípios e estados brasileiros.

Esta ausência ou a falta de estímulo para ocupação de lugares estratégicos no controle social, vem provocando sérios impactos negativos na vida das comunidades e povos tradicionais do Brasil, sobretudo na juventude, que desamparada não encontra caminhos para expressar suas indignações, atitudes, ideias e soluções para problemas que podem e devem ser resolvidos, no que tange a transversalidade das relações étnico-raciais seja na saúde, segurança pública, educação, cultura, meio ambiente, reforma agrária, justiça e dentre outras.

Juventude de Terreiro debate o Plano Juventude Viva
"A juventude de terreiro, vem amargando promessas de apoios, ações, projetos e programas que deveriam reconhecer e garantir seus direitos, além da criação de alternativas e perspectivas que promovessem a sustentabilidade cultural desse povo, mas sem oportunidades e invisíveis na sociedade, o país está perdendo gradativamente a juventude para o tráfico, os indicadores apontam uma maior incidência de jovens, masculino, cor negra e das periferias pobres, sendo brutalmente assassinados por crimes violentos letais intencionais (CVLI), uma verdadeira ação de extermínio da juventude negra acontecendo à nossas vistas", pontua Fábio Gomes - Coordenador da Rede FAVOS/PE.

"Temos Povos e Comunidades Tradicionais nos centros urbanos, rurais e presentes nos mais remotos lugares do Brasil, está sendo isso debatido amplamente e ganhado espaços em nossas mídias sociais, não sendo está causa abraçada pelos grandes veículos de comunicação, vemos como um grande obstáculo a ser enfrentado por nossa geração, que só ganha espaço na comunicação nacional quando somos infratores e nunca como vítimas do genocídio esclarecido. Não estamos encontrando espaços para ser, exercer e viver plenamente nossa cidadania", finaliza Fábio.
Fábio Gomes e a Ministra Luíza Bairros
A coordenação e organização do evento III CONAPPIR foi da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República (Seppir/PR) e o Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial (CNPIR), que trouxe 1.200 delegadas e delegados, além de 200 convidados.

Exposição 
A III CONAPIR aconteceu em meio às comemorações dos 10 anos de criação da Seppir. Durante o evento, esteve em cartaz a exposição “Seppir 10 – Uma década de igualdade racial’, que tem patrocínio da Petrobras. A mostra permitiu ao conferencista um passeio pelas ações desenvolvidas nos últimos dez anos pela secretaria, parceiros governamentais e entidades da sociedade civil, em torno das políticas de promoção da igualdade racial e questões a elas relacionadas. A abordagem do tema foi feita por meio da compilação de cartazes, banners, publicações, fotografias, entre outros materiais gráficos.

Lançamentos
Durante a programação da III Conapir foi lançado o primeiro módulo do Sistema de Monitoramento das Políticas de Promoção da Igualdade Racial. Disponível na internet, o material pode ser acessado sem cadastro ou senha. A etapa que entrou no ar é composta por duas ferramentas de visualização: painéis de monitoramento (com informações específicas para cada eixo dos programas) e mapas de diagnóstico (com dados territoriais).

O objetivo foi auxiliar gestores públicos a encontrar caminhos para a avaliação e o aperfeiçoamento da implementação de duas políticas estratégicas coordenadas pela secretaria: o Programa Brasil Quilombola (PBQ) e o Plano de Prevenção à Violência contra a Juventude Negra - Juventude Viva. O sistema foi desenvolvido pela Seppir em parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e a Fundação Ford.

Outro lançamento foi o do Guia de Implementação do Estatuto da Igualdade Racial para Estados, Distrito Federal e Municípios. Elaborada pela Seppir em parceria com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), a publicação traduz a principal recomendação do Grupo de Trabalho Estatuto da Igualdade Racial (GT-EIR), criado para analisar e propor caminhos para a efetivação da Lei 12.888, de 20 de julho de 2010, que institui o Estatuto da Igualdade Racial. Direcionada a técnicos, gestores e ativistas, o guia pode ser utilizado como subsídio para reuniões de grupos intersetoriais, conselhos e fóruns intergovernamentais de promoção da igualdade racial.

Fonte:
Fábio Gomes - Comunicação Social Rede Favos

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Zumbi o grande líder do quilombo dos Palmares, respeitado herói da resistência antiescravagista.

20 de Novembro dia da Consciência Negra
Zumbi foi o grande líder do quilombo dos Palmares, respeitado herói da resistência antiescravagista. Pesquisas e estudos indicam que nasceu em 1655, sendo descendente de guerreiros angolanos. Em um dos povoados do quilombo, foi capturado quando garoto por soldados e entregue ao padre Antonio Melo, de Porto Calvo. Criado e educado por este padre, o futuro líder do Quilombo dos Palmares já tinha apreciável noção de Português e Latim aos 12 anos de idade, sendo batizado com o nome de Francisco. Padre Antônio Melo escreveu várias cartas a um amigo, exaltando a inteligência de Zumbi (Francisco).
Em 1670, com quinze anos, Zumbi fugiu e voltou para o Quilombo. Tornou-se um dos líderes mais famosos de Palmares. "Zumbi" significa: a força do espírito presente. Baluarte da luta negra contra a escravidão, Zumbi foi o último chefe do Quilombo dos Palmares.
O nome Palmares foi dado pelos portugueses, em razão do grande número de palmeiras encontradas na região da Serra da Barriga, ao sul da capitania de Pernambuco, hoje, estado de Alagoas. Os que lá viviam chamavam o quilombo de Angola Janga (Angola Pequena). Palmares constituiu-se como abrigo não só de negros, mas também de brancos pobres, índios e mestiços extorquidos pelo colonizador.
Os quilombos, que na língua banto significam "povoação", funcionavam como núcleos habitacionais e comerciais, além de local de resistência à escravidão, já que abrigavam escravos fugidos de fazendas. No Brasil, o mais famoso deles foi Palmares.
O Quilombo dos Palmares existiu por um período de quase cem anos, entre 1600 e 1695. No Quilombo de Palmares (o maior em extensão), viviam cerca de vinte mil habitantes. Nos engenhos e senzalas, Palmares era parecido com a Terra Prometida, e Zumbi, era tido como eterno e imortal, e era reconhecido como um protetor leal e corajoso. Zumbi era um extraordinário e talentoso dirigente militar. Explorava com inteligência as peculiaridades da região.
No Quilombo de Palmares plantavam-se frutas, milho, mandioca, feijão, cana, legumes, batatas. Em meados do século XVII, calculavam-se cerca de onze povoados. A capital era Macaco, na Serra da Barriga.
 Domingos Jorge Velho, um bandeirante paulista, vulto de triste lembrança da história do Brasil, foi atribuído a tarefa de destruir Palmares. Para o domínio colonial, aniquilar Palmares era mais que um imperativo atribuído, era uma questão de honra. Em 1694, com uma legião de 9.000 homens, armados com canhões, Domingos Jorge Velho começou a empreitada que levaria à derrota de Macaco, principal povoado de Palmares. Segundo Paiva de Oliveira, Zumbi foi localizado no dia 20 de novembro de 1695, vítima da traição de Antônio Soares.
“O corpo perfurado por balas e punhaladas foi levado a Porto Calvo. A sua cabeça foi decepada e remetida para Recife onde, foi coberta por sal fino e espetada em um poste até ser consumida pelo tempo”.
O Quilombo dos Palmares foi defendido no século XVII durante anos por Zumbi contra as expedições militares que pretendiam trazer os negros fugidos novamente para a escravidão. O Dia da Consciência Negra é celebrado em 20 de novembro no Brasil e é dedicado à reflexão sobre a inserção do negro na sociedade brasileira.
A data foi escolhida por coincidir com o dia da morte de Zumbi dos Palmares, em 1695.

A lei 10.639, de 9 de janeiro de 2003, incluiu o dia 20 de novembro no calendário escolar, data em que comemoramos o Dia Nacional da Consciência Negra. A mesma lei também tornou obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira. Nas escolas as aulas sobre os temas: História da África e dos africanos, luta dos negros no Brasil, cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, propiciarão o resgate das contribuições dos povos negros nas áreas social, econômica e política ao longo da história do país.

terça-feira, 19 de novembro de 2013

1º Fórum sobre Religiosidade de matriz africana e Lei Ambiental Montes Claros- MG

MONTES CLAROS 13 DE NOVEMBRO DE 2013


1º Fórum sobre Religiosidade de matriz africana e Lei Ambiental ,na galeria Godofredo Guedes praça da matriz no município
de Montes Claros MG.
 Carta dos praticantes de religião de matriz Africana a toda cidade de Montes Claros. Somos um povo multicultural, nascidos num pais que se orgulha de ser preto branco e indígena, que assegura a todos o direito a liberdade de ir e vir, de pensamento e de religião. Aqui nascemos e aqui ousamos construir nossas vidas. Vivemos numa democracia plural que assegura a todas a vivência plena, respeitando a diversidade peculiar a  um povo gestado sob o pilar da diversidade.
Queremos que seja assegurada o nosso direito garantido pela Constituição, de praticar nosso culto, perpetuando nosso credo e cultura. Queremos ter o direito de viver sem a premissa das ações preconceituosas, materializadas em algumas ocasiões na pessoa de alguns agentes do estado integrantes das forças policiais. Queremos respeito as nossas convicções e práticas religiosas. Somos cidadãos pagadores de impostos e conhecedores dos nossos direitos.
Sabemos que o viver em sociedade, exige de todo o desprendimento e respeito aos direitos coletivos. Entretanto, exigimos tratamento igualitário e respeitoso. Causa-nos indignação perene atos e atitudes que atentem contra a nossa dignidade de cidadão. Nossos cultos são tão importantes como os outros que ilustram o imaginário da religiosidade brasileira.
Vimos, manifestar nossa inquietude e insatisfação, no tocante ao trato desrespeitoso e preconceituoso que tem marcado o cotidiano de alguns terreiros em Montes Claros. Entendemos que tais atitudes ferem todos os preceitos legais que nos garantem os direitos fundamentais. Apoiamos-nos dispositivos presentes na Constituição, no Estatuto da Igualdade Racial, na Declaração Universal dos Direitos humanos, dentre outros, para externar a toda comunidade montesclarese que a nossa luta  em defesa do direito de manifestarmos nossa crença é perene, ela não para, pois se sustenta na convicção serena de que  viver a pluralidade  cultural e religiosa é pois o grande desafio da sociedade contemporânea.
Neste sentido é que defendemos a realização de uma audiência pública na Câmara Municipal de Montes Claros, em data a ser marcada para a discussão e busca de solução para o problema ora mencionado e a formatação de termo de ajuste de conduta.

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

CATOPÉS NO CONTEXTO RELIGIOSO EM MONTES: FESTEIROS DE FÉ E DEVOÇÃO, 2012/2013


                                                                                              Rafael Lopes Pereira*

RESUMO: O presente trabalho mostra a organização da festa tradicional dos Catopés em Montes Claros que ocorre todos os anos na cidade, a qual possibilita reviver a memória cultural e religiosa dos antigos, como forma de tradição ha mais de cem anos. Sendo patrimônio histórico-cultural e material da cidade, o festejo tem por objetivo não deixar esmaecer a cultura local e suas características. Com o crescimento da cidade, o espaço para a cultura foi-se perdendo e pouco preservado, de modo que foram os Catopês que assumiram o compromisso de não deixar cessar a tradição, dando seguimento ao festejo numa tarefa cumprida todos os anos. Nesse sentido, as festas atuam como patrimônio histórico e cultural para a cidade, caracterizando as raízes advindas do cristianismo e no congado brasileiro, a partir de suas formas de expressão, como é o caso das missas, das procissões e dos cortejos rituais que estão presentes na composição dos momentos do grupo dos Catopês.

PALAVRAS-CHAVE: Festa Religiosa; Grupo Catopês; Montes Claros.

ABSTRATC: This paper shows the organization of the traditional feast of Montes Claros Catopês that occurs every year in the city, which allows relive the memory of the ancient cultural and religious, as a form of tradition for over one hundred years. Being historical-material and cultural city, the celebration aims to not let fade the local culture and its characteristics. With the growth of the city, space for culture was lost and little preserved, so that Catopês were committed to not let tradition stop, continuing to feast on a task accomplished pro every year. Accordingly, the parties act as historical and cultural heritage of the city, featuring roots stemming from Christianity and congado Brazil, from its forms of expression, such as Masses, processions and parades rituals that are present moments in the composition of the group of Catopês.
KEY WORDS: Religious Feast; Group Catopês; Montes Claros. 

Acadêmico do 6° período de História Licenciatura Plena. ISEIB – E mail: <rafaellopes33@yahoo.com.br

1. INTRODUÇÃO

1.1 Catopés como Patrimônio Histórico-Cultural

O grupo Catopés da cidade de Montes Claros, tendo sobrevivido ao desenvolvimento da cidade e ao pouco investimento financeiro, só fez crescer com o passar dos anos. Como patrimônio cultural e material do município, o grupo revive todos os anos o que aprenderam com os pais e avôs, o que foi passado de geração a geração. Com a manifestação do grupo na cidade, Montes Claros pôde obter um patrimônio cultural que engloba a história da cidade e de um passado importante a respeito do conhecimento dos antigos, em forma de momentos que são revividos e indispensáveis. E ainda que o município se desenvolva a cada ano, a necessidade de preservação dos festejos existe, pois eles já fazem parte da vida do povo que os acolheu e que se encanta com a alegria dos festeiros. A esse respeito, nas palavras do autor:
O patrimônio cultural de uma dada sociedade é formado por um tripé indissociável em que se contemplam as seguintes dimensões; a dimensão natural, ou ecológica, a dimensão histórico-artística e a dimensão documental. Neste sentido o próprio meio ambiente, os conjuntos urbanos e os sítios de valor históricos, paisagísticos, artísticos e arqueológicos, paleontológico e científico, as obras, os objetos, os documentos, as edificações, as criações cientificas, artísticas e tecnológicas, as formas de expressão e até mesmo os modos de criar, fazer e viver são bens culturais de uma sociedade e por isso devem ser preservadas. (BOSI, 2005, p.133)

        Os objetivos da festa é a consagração das três divindades: Nossa Senhora do Rosário, São Benedito e o Divino Espirito Santo. A consagração é feita através de rituais religiosos presentes nos momentos da festa. O propósito é desenvolver a interação entre as pessoas, sem distinção de classe social ou raça, de modo que a festa é para todos que quiserem apreciá-la e dela participarem. O festejo nos remete à mistura e a miscigenação de que é formado o Brasil, e a preservação da festa é o principal objetivo dos grupos, uma vez que lhes foi dada a missão de passar tudo que aprenderam para a geração futura, numa espécie de herança. A autora Ângela Martins Ferreira (2009) expõe que “é assim que nossas festas jamais morreram, pois são passadas de geração a geração.” (FERREIRA, 2009, p.44)
Nesse sentido, os Catopês têm a missão de cumprir todos os momentos da festa. Uma vez que revivendo cada instância que lhes foi ensinada, o grupo revive toda a manifestação religiosa, com o compromisso de que no ano seguinte tudo volte a se repetir. Nas apresentações, os Catopês estão sempre sorrindo, pulando e cantando, dando salves ao santo protetor de devoção, esbanjando religiosidade, compromisso e simplicidade a cada passo.

1.2 A Festa em Montes Claros

Agosto é o mês da festa em Montes Claros. Sua formação adveio da união entre três santidades: Nossa Senhora do Rosário, São Benedito e o Divino Espirito Santo; nos Catopês, dois grupos são devotos de Nossa Senhora do Rosário e um grupo devoto de São Benedito. Independente do santo do dia, todos respeitam e demonstram seriedade em suas apresentações. A esse respeito, o estudioso Luiz Ricardo Silva Queiroz aponta:
O Bispo Dom João Pimenta reuniu no mesmo calendário três festas religiosas que já aconteciam na cidade em épocas diferenciadas. Assim a festa do Divino, que acontecia no período de Pentecostes, e a festa de São Benedito, que acontecia no mês de setembro ou outubro, foram somadas à festa de Nossa Senhora do Rosário que já era realizada no mês de agosto. (QUEIROZ, 2002, p.46)

Nas apresentações, os Catopês fazem seus rituais cantando, dançando, celebrando, com muita dedicação e, para que tudo dê certo, os coordenadores é quem comandam os grupos. O grupo de Catopês tem três pessoas que dão força aos grupos, que são os seguintes: para o Grupo de Nossa Senhora do Rosário, os Mestre Zanza (João Pimenta); Mestre João Farias e Zé Expedito que comandam o terno de São Benedito. Os outros grupos que compõem a festa são os Caboclos que homenageiam o Divino Espírito Santo, cujo coordenador costumava ser o falecido Joaquim Polo, substituído atualmente por sua filha Maria do Socorro Pereira Domingues. Além da Marujada, comandados pelo Mestre Nenzim e pelo falecido Mestre Miguel, também devotos do Divino.
Estão sempre animados ao celebrar para seu santo, fazendo com que a força e a fé de um grupo sejam transmitidas para o outro. Dando seguimento aos cantos e salves ao santo, com o desfile pelas ruas do centro de Montes Claros. Em suas apresentações e nos desfiles pelas ruas do centro do município, as raízes são relembradas e a influencia africana é reavivada em suas coreografias junto dos batuques dos tambores que se misturam com os cânticos religiosos, dando o máximo de si, sem mesmo se importar com o sol forte da época. Para Luiz Ricardo Silva Queiroz, “os elementos distintos que compõem a performance dos Catopês deixam evidente que são esses grupos  os que preservam as maiores influências da cultura africana, na composição no que diz respeito a figurações rituais, coreografias e musicais.” (Queiroz, 2002, p.40)
Com o passar do tempo, os grupos foram crescendo, de tal forma, que foi necessário dividí-los, em favor de ficarem mais organizados. Assim, os Mestres, junto aos membros, dão vida à festa, apresentam e fazem uma mistura religiosa, social e cultural. No segmento religioso, eles se empenham muito, fazendo estandartes dos santos, enfeitando as imagens, celebrando missas e cantando músicas religiosas para os santos; já no segmento social, eles transmitem uma interação com o publico sem distinção; e na parte cultural, trazem em suas performances, personagens ilustres da época colonial, com coreografias e a presença da realeza vinda de Portugal, os príncipes e princesas, reis e rainhas, e até os índios que são representados na festa.
Os Catopês são responsáveis pela preservação da religiosidade e sua ligação com fatos da história brasileira. A importância da religiosidade é muito grande para os Catopês, pois, o principal ritual é a devoção e a fé que os mesmos depositam nas santidades, para as quais investem tudo o que sentem, dessa maneira é que o festejo se realiza. Com a tradição dos Catopês exposta ao público ano a ano, tornando-se fonte de conhecimento religioso, junto de suas crenças e muitas outras lembranças, a herança deixada pelos ancestrais do grupo se torna uma maneira de conhecer melhor o grupo e os membros se tornam responsáveis por não deixar esmaecer essa tradição.
Durante muito tempo, Mestre Zanza é quem está à frente do festejo, e segundo a tradição, quem deve substituí-lo é uma filha ou um filho seu. O Mestre está todos os anos presente nas comemorações, nas ruas de Montes Claros, dando sempre um brilho a mais ao espetáculo que contagia o município; é notável o orgulho que ele tem em estar ali, vendo anualmente os grupos fazerem aquilo que seus pais e avós deixaram para eles. O Padre João Batista é o celebrante das missas e participa regularmente dos festejos, o Padre João é da comunidade do Bairro Sagrada Família, da Paroquia São Norberto e sua presença já virou tradição, celebrando a missa e saindo em procissão e desfile pelas ruas. Conforme aponta a autora: “Padre João Batista, sorridente como sempre, vai à frente do rei, rainha, príncipe e princesas. É realmente uma pessoa carismática que ama o folclore e desfila com fé e muito entusiasmo.” (FERREIRA, 2009, p.34)
A interação da comunidade com o grupo é fundamental, pois, são eles responsáveis por roubar a bandeira e guardá-la, para que no próximo ano, ela possa ser levantada no mastro e, novamente, dar seguimento a tradição. Os mordomos fiéis, que guardam a bandeira, geralmente patrocinam um almoço coletivo para os grupos e seus filhos e netos que são os reis e rainhas nos desfiles. Podemos ver que a festa é um conjunto de momentos em que estão todos os envolvidos participantes ativos do festejo, não dependendo de estarem engajados nos grupos, mas participando dos momentos que constroem a festa. Conforme atenta o estudioso:
Os mordomos são pessoas da comunidade, sorteadas para grudarem as bandeiras dos santos, de um ano para o outro. A cada ano, a festa tem três mordomos, o de Nossa Senhora do Rosário de São Benedito e o do Divino Espirito Santo. No período de realização do ritual, os grupos de Catopês, Marujos e Caboclinhos vão até a casa dessas pessoas buscar a bandeira e conduzí-los até a Igreja do Rosário. (QUEIROZ, 2002, p.48.)

Dessa maneira, eles vão dando continuidade ao festejo, sempre cumprindo com as etapas, para que tudo dê certo e que se cumpram os rituais passados à geração, uma vez que, cumprindo os rituais, eles revivem a história e ainda ensinam aos mais novos as etapas das tradições do grupo. Na realização das etapas, os Mestres é quem comandam, pois eles são os mais velhos e guardiões das tradições passadas a eles pelos mais antigos, e assim os grupos vão se apresentando sempre bem vestidos e alegres.
Quanto ao método utilizado para as pesquisas que levaram a construção desse trabalho, essas foram feitas no ano de 2012 e 2013, as buscas foram feitas através de bibliografias, jornais e revistas que contam a história do grupo em Montes Claros, elas proporcionaram suporte aos relatos dos personagens da festa. No entanto a dada exata do início da festa não tenha sido encontrada, é sabido que a trajetória do grupo no município é muito grande e data de mais de cem anos.
Os locais em que foi encontrado um grande número de acervos sobre o tema, foram Centro Cultural, Secretaria de Cultura e Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES), e a associação dos Catopês, Marujos e Caboclinhos possibilitou uma pesquisa com amplo conhecimento da organização dos grupos.
As ruas da cidade também serviram para ver o quanto os Catopês são importantes para o município montesclarense, pois é a cultura que é transmitida para o povo, que denota toda a devoção que eles têm. Pôde-se observar de perto como tudo funciona, desde a ornamentação da cidade até a última procissão, viu-se muitas orações, cantos, batuques de tambores, rituais presentes, tudo para agradar o santo padroeiro.


2. Os Catopés e o Imaginário Popular

Segundo Valdemar Ferreira (2010): “Imaginário popular é a crença antiga das forças divinas exercidas pela natureza. Onde o homem era a peça de suma importância do grande teatro divino que é o universo.” (Valdemar Ferreira, 2010, p. 1-2) .Nesta relação do homem e o divino é ligada ao imaginário popular onde o homem acredita naquilo que lhes foi contado e passado de geração em geração, onde para os antigos aqueles fenômenos da natureza que não tinham explicação eles apelavam para o divino, pois para eles a vontade dos deuses estava acima dos homens, com muita obediência e respeito no divino o homem respeita aquilo que é sagrado para os povos antigos, os catopês tem essa ligação com o divino, são devotos das divindades adivinhas de tempos antigos, mas que foi sendo passado de boca em boca as gerações, assim foram seguindo a tradição e acreditando no mito que se encere.
Para Valdemar Ferreira (2010): “[...] toda cultura tem seu mito, sua designação para aquilo que é inexplicável pelos experimentos humanos.” (Valdemar Ferreira, 2010, p.2). Neste sentido o mito ele conta o que os povos não conseguem explicar, eles somente acreditam, o mito é oral passando de boca a boca e diz muito sobre o povo assim o mito retrata bem a manifestação do divino. Seguindo este contexto as lendas também se apresentam para explicar os argumentos que remetem ao imaginário popular e as tradições populares.
 Conforme Valdemar Ferreira (2010): “As lendas são tradições populares ou histórias fabulosas sobre fatos históricos ou característicos de algumas sociedades.” (Valdemar Ferreira, 2010, p.3). O grupo catopês sendo uma manifestação cultural espalhou-se e foi trazendo para o povo local a força da crença e das lendas. Segundo Valdemar Ferreira(2010): “A população usava de toda a cultura presente para espalhar suas crenças e lendas.” (Valdemar Ferreira, 2010, p.4)
Para Valdemar Ferreira (2010): “O povo coloca muito de suas crenças nas histórias populares ou lendas e isso foi gradativamente enriquecido pelas culturas que aqui se homogeneizaram como a cultura africana e indígena.” (Valdemar Ferreira, 2010, p.4). Portanto o regionalismo mostra que as lendas populares não estão somente no imaginário, mas nas crenças do meio cultural do povo no Brasil, por exemplo, onde a maioria é católica, aonde as histórias vão ao encontro com a religião cristã.
Neste sentido as histórias populares e as lendas fluem na cultura, é onde se vê que a tradição do povo é viva, é o caso dos catopês que vive e revive na região de Montes Claros espalhando sua cultura e seu imaginário popular, através da fé nos santos que são para eles as divindades em que tudo o que fazem durante o festejo é para eles, demonstrando muita devoção nos menos. O que se vê nos catopês é o homem expressando suas crenças, fazendo ganhar vida a sua manifestação, isso que o imaginário concede criar e viver as criações no decorrer da história.

3. Fé e devoção representadas pelos catopês nas festas de agosto
           
A pesquisa foi desenvolvida com o objetivo de conhecer a religiosidade, a cultura e a tradição do grupo Catopês no contexto religioso em Montes Claros, bem como a fé e a devoção do povo que faz crescer a cada apresentação na cidade, onde tudo é feito com o objetivo de agradar os santos e em favor do compromisso que se tem de seguir a tradição dos momentos da festa. Sendo assim, os grupos Catopês, Marujos e Caboclinhos todos os anos repetem os rituais de benção e benevolência às santidades. A preparação dos festejos é feita na associação própria dos grupos como uma espécie de treinamento, pois é lá que eles ensaiam e se aprontam para o início das festas, na qual começam o ritual, fazem rodas e batem palmas e em seguida começam a girar e a cantar para seu santo de devoção. Sobre isso, de acordo com as palavras de Jean Mendes (2004):
Essa forma de manifestação católica religiosa, e constituinte do catolicismo popular que engrena sentimento de coletividade circundada por um arcabouço metodológico repleto de crenças e ritos, mas que não exerce sobre os homens os mesmos desejos e obrigações ritualísticas do catolicismo oficial. (MENDES, 2004, p.55-56)

O grupo criou raiz na cidade, formando sua própria característica e sua própria forma de expressar as suas características, de modo que alguns momentos tornaram-se somente deles. Seguem o cristianismo, mas agregam fatos próprios da cultura local e de momentos com rituais próprios do grupo. Trata-se de uma mistura entre cultura e religiosidade, na qual o mais importante é a fé e a devoção que eles têm em seus santos. A isso, acrescenta-se:
Assim é a festa de agosto em Montes Claros, uma expressão cultural que tem se renovado na contemporaneidade, associada a fatores como religião, entretenimento, (re)afirmação social e uma série de outras dimensões que se confrontam nesse universo cultural. (QUEIROZ, 2002, p.47)

A festa agrega vários nomes, entre os quais estão: Movimento; festejo; manifestação, todos são válidos, uma vez que seu caráter popular possibilita esse universo de dimensão em que o grupo se tornou. É a dedicação de Mestre Zanza que faz a festa ficar cada vez presente na cidade, sua luta na preservação do grupo é nítida, o que resulta numa festa de orgulho. A religiosidade do grupo é vista em todas as instâncias, em cada passo e cada rosto dos membros que expressam o sentimento de comunhão e partilha dos festejos; ali é vivo o sentimento de fé e de cultura que é cultivada como forma de tradição, de modo a cumprir o papel que foi passado aos participantes, em forma de grande respeito. Para Hermes de Paula (2008): “Ao sair da igreja os dançantes não dão as costas para o altar fazendo sempre salamaleques respeitosos, dançando uma dança mais suave, vão saindo em conjunto, sempre de frente para o altar.” (HERMES DE PAULA, 2007, p.138)
Como forma de tradição, os participantes levantam os mastros com a bandeira do santo do dia. O primeiro mastro a ser levantado é o de Nossa Senhora do Rosário que, em seguida, ganha as ruas do centro de Montes Claros. Depois, é a vez de levantar o Mastro de São Benedito que, no próximo dia, toma as ruas locais e, por último, é o mastro do Divino que é levantado, rumo às ruas da cidade, seguindo sempre esta sequência.
Nas composições das músicas, os participantes agregam um canto pequeno com poucas estrofes. Como numa espécie de coro, o Mestre canta e os membros respondem, sempre dando salve ao santo de que são devotos. Seus instrumentos geralmente são produzidos por eles mesmos e todos são de percussão. A esse respeito, Raquel Mendonça (2011) expõe:
 A música dos Catopês é melodicamente pobre, predominando o ritmo, tanto que o seu instrumental é exclusivamente de percussão. São tamborins, pandeiros e caixas, em geral fabricados por eles mesmos, usando couro de cabrito. Cantam sempre sob o comando do mestre, que canta uma estrofe e todo o grupo responde. Apesar da pouca musicalidade, a riqueza do ritmo e o arranjo dos instrumentos dão um efeito de rara beleza e emoção. (MENDONÇA,  2011, p.1)

3.1. Os Donos da Festa

As três divindades formam os santos da festa. Nossa Senhora do Rosário, a santa dos Catopês, e São Benedito são santos de origem humilda e têm como fundamento a caridade e a fraternidade, e um dos poucos santos considerados de origem da raça negra, tendo a história voltada para a fraternidade e ao espírito de humildade e o Divino, que é a terceira pessoa da santíssima trindade, tem sua essência na fraternidade e igualdade entre todos, simbolizada pela pomba com uma coroa bem enfeitada.
A história de Nossa Senhora pela formação mítica se formava ainda na África, quando uma imagem de Nossa Senhora do Rosário apareceu no mar, quando o grupo de congo se dirigiu para a areia tocando seus instrumentos, só conseguiu fazer com que a santa se movesse uma vez num movimento muito rápido. Assim, Nossa Senhora se encaminhou para frente e parou; então todos vieram, os negros moçambicanos, batendo seus tambores recobertos com folhas de inhame, cantando para a santa e pedindo a ela que viesse para protegê-los. A imagem veio se encaminhando num movimento de vaivém das ondas, lentamente, até chegar à praia. (PEREIRA, 1990)
São Benedito foi pastor de ovelhas e lavrador. Aos dezoito anos de idade o jovem já havia decidido consagrar-se ao serviço de Deus e aos vinte e um anos, um monge dos irmãos eremitas de São Francisco de Assis o chamou para viver entre eles. Fez votos de pobreza, obediência e castidade e, coerentemente, caminhava descalço pelas ruas e dormia no chão sem cobertas. Era muito procurado pelo povo que desejava ouvir seus conselhos e pedir-lhe orações.
Cumprindo seu voto de obediência, depois de dezessete anos entre os eremitas, foi designado para ser cozinheiro no Convento dos Capuchinhos. Sua piedade, sabedoria e santidade levaram seus irmãos de comunidade a elegê-lo o Superior do Mosteiro, apesar de analfabeto e leigo, pois, não havia sido ordenado sacerdote. Seus irmãos o consideravam iluminado pelo Espírito Santo, já que fazia muitas profecias. Ao terminar o tempo determinado como Superior, reassumiu com muita humildade, mas com alegria, suas atividades na cozinha do convento.
Sempre preocupado pelos os mais pobres do que ele, aqueles que não tinham nem o alimento diário, retiravam alguns mantimentos do Convento, escondia-os dentro de suas roupas e os levava para os famintos que enchiam as ruelas das cidades. Conta a tradição que, em uma dessas saídas, o novo Superior do Convento o surpreendeu e perguntou: “Que escondes aí, embaixo de teu manto, irmão Benedito?” E o santo humildemente respondeu: “Rosas, meu senhor!” e, abrindo o manto, de fato apareceram rosas de grande beleza e não os alimentos de que suspeitava o Superior.( PRAZERES, 2009)
A história do Divino foi trazida pelos portugueses colonizadores quando Itanhaém era ainda uma vila, a “Vila de Nossa Senhora da Conceição de Itanhaém”. Deduz-se daí que se trata de uma festa bem antiga que veio junto com as bagagens, malas, usos, costumes e um bocado de fé dos colonizadores portugueses, uma vez que é uma festa realizada em Itanhaém há mais de quatrocentos anos.
A tradição folclórica religiosa trazida é a seguinte: em uma época conturbada no reino português, quando a vida econômica era terrível, em que a administração era perturbada e as ameaças à segurança do trono da soberana Imperatriz Isabel eram agravadas, a Imperatriz, por sua vez, desejando ardentemente que Portugal saísse dessa grave crise, teve uma atitude inesperada que causou enorme impacto junto à corte, ela “abdicou” da coroa em favor do Divino Espírito Santo. A Imperatriz Isabel era muito religiosa e possuidora de uma fé inabalável, então, resolveu que, enquanto os sérios e graves problemas que atravancavam a vida do país não fossem solucionados, Portugal seria governado pela Santíssima Trindade.
No dia de Pentecostes, toda a corte, em procissão, tendo à frente a Imperatriz e o Imperador, dirigiu-se à Catedral, depositando no altar-mor o cetro e o estandarte (símbolos do poder do império). O cortejo e a cerimônia configuravam a promessa da Imperatriz que, a partir daquele instante, recolheu-se a um convento e aguardou os acontecimentos. Portugal desde então seria governado pelo Divino Espírito Santo.
Não sabemos se a fé ou a retomada da ponderação na corte foi a responsável pela paz, mas a medida extrema e inusitada da soberana Imperatriz findou a revolta e os ânimos foram acalmados. Dessa forma, a política voltou à normalidade e, consequentemente, a vida econômica de Portugal voltou à estabilidade. Esse acontecimento foi tido pelo povo como um milagre do Divino Espírito Santo, em atenção às preces da devota soberana. Sendo assim, a Imperatriz Isabel atendendo ao seu povo, retorna ao trono realizando novo cortejo à Catedral e reinvestindo-se de sua realeza. (CALIXTO, 2011)
O Divino Espirito Santo é a terceira pessoa da Santíssima Trindade e tem sua essência na fraternidade e na igualdade entre todos os povos, simbolizado pela pomba com uma coroa, sendo essa bem enfeitada com pedras e um manto de veludo vermelho.
Assim é o universo dos Catopê, sempre com muita fé nos santos de que são devotos, o grupo tem o seguimento do cristianismo, manifestado em ritos comuns da religião católica, ainda que não se prendam ao cristianismo formal, já que tem suas doutrinas e condutas diferenciadas dos grupos congadeiros, não deixando, por isso, de ser católico, uma vez que criaram uma identidade no seguimento da tradição que se desenvolveu na cidade e em outras parte do estado. Sobre isso, nas palavras do autor:

O universo do mundo congadeiro engloba os espaços, simbólicos e todos os aspectos ritualísticos que constituem o caminho para sua ligação com o sagrado, comporta elementos característicos e preceitos que convergem num objetivo central qual seja a direção rumo ao mundo do não natural, do imaterial do sagrado. Os aspectos desse mundo do congadeiro, concernentes, constituídos e moldados inicialmente o desejo do sistema religioso que os comporta, a religião católica, mescla um universo de homens comuns sem o com prometimento com o sistema religioso formal e oficial, com uma estrutura formalizada, como é estabelecida nos sistemas e tradições da igreja nos moldes católicos. (MENDES, 2004, p.55-56.)

As Festas de Agosto em Montes Claros manifestam alegria, fé e devoção do povo que acredita na religiosidade; trata-se de um momento de mostrar a devoção e a crença no que foi passado de geração a geração, e que se faz perpetuar na história de Montes Claros, revivendo essa instância a cada ano da festa, dando oportunidade para a cultura e para a religiosidade. Sobre esse assunto, menciona-se:
Para compreensão significativa da variedade de situações vivenciadas durante a manifestação dos grupos Catopês, Marujos e Caboclinhos, são importantes apresentar as etapas que constituem a essência dessa festividade em Montes Claros. De forma ampla, a festa de agosto em Montes Claros conta com sete situações distintas que são inter-relacionadas pelo desempenho dos grupos durante o ritual. Essas situações se estabelecem nas visitas as casas dos mordomos, no levantamento dos mastros, nos reinados, e no império, nas missas e homenagem aos santos, no encontro dos grupos de congados na procissão e na missa de encerramento. (QUEIROZ, 2002, p.48)


O autor completa que “no entanto, a essência do festejo é preservada nas músicas, nas coreografias, na religiosidade e em toda complexidade simbólica dessas expressões.” (QUEIROZ, 2002, p.47). A festa tem suas particularidades no que diz respeito às suas características. Sua imagem é de uma festa cultural e religiosa, que pode ser considerado um patrimônio cultural e material para a cidade, se observado o forte intuito de preservação que os membros do grupo têm. Já em outros momentos, podemos perceber a preservação da história nos cortejos pelas ruas que relembra a corte no Brasil na época colonial, e por conta disso, a festa tornou-se um festival de cultura.

3.2 Tradições Indispensáveis

O grupo tem o costume de mostrar muito respeito e devoção ao santo, e para demostrar o respeito com o sagrado, os participantes têm o costume de se vestirem de cores específicas nas apresentações para seu santo protetor. Cada grupo tem uma cor diferente e que é relacionada ao santo de devoção, é com o que mostram mais uma vez  o quanto são devotos do santo.  A esse respeito:
Os Catopês apresentam pequenas variações nas cores de suas vestimentas, tendo em vista que, nos ternos de Montes Claros, há uma predominância da cor branca como base da coloração das roupas dos integrantes. No entanto, cores como o azul, rosa, e o vermelho, que estão relacionados aos santos devotos pelos grupos, podem apresentar nuanças na composição dos figurinos, fazendo parte de detalhes e até mesmo da configuração geral da roupa dos Mestres e ou de integrantes hierarquicamente mais importantes dentro dos ternos. (QUEIROZ, 2002, p.40.)

Em alguns momentos para os Catopês essa conduta é bem natural, uma vez que eles não são impostos, pois é a tradição que se tem, e assim eles vão seguindo de forma que possam expressar a devoção ao seu santo, fazendo de pequenos detalhes uma verdadeira motivação para agradar ao santo. E por falar sempre em tradição, o funcionamento o cumprimento dos momentos da festa são instâncias fundamentais.  
Catopé significa dança ou ritmo com batuques. No início, os grupos eram formados por homens e crianças; a princípio eram somente homens e negros que poderiam dançar nos ternos, mas com o passar dos anos, as mulheres também puderam participar; hoje, todos podem participar. Em Montes Claros, os ternos têm uma diferença entre grupos, os seus reis e rainhas geralmente são crianças e a maioria branca, diferente dos outros que são os próprios dançantes dos ternos, e em Montes Claros são as crianças os reis e rainhas, independente de raça que são inscritas e sorteadas para representar no festejo. Para essa característica, há uma explicação para o fato de somente crianças e a maioria delas branca, poderem desfilar nos reinados, Raquel Mendonça explica:
Tive certa vez uma explicação a respeito de tal diferença, ou seja, porque crianças - a maior parte brancas - e não adultos negros. A justificativa é a seguinte: essa festa era exclusiva das senzalas. Apenas os escravos participavam. Acontece que era costume, não só aqui como em todas as partes, a mãe-preta, uma escrava que amamentava os filhos do senhor. Para essa função era sempre escolhida uma mulher de boa saúde e de boa índole, em quem os patrões pudessem confiar suas crianças. E sempre acontecia que essa escrava, pelo fato de alimentá-las com seu leite, acabava por se sentir meio mãe, apaixonada e dedicada ao "sinhozinho" ou à "sinhazinha".

Dizem que numa época, uma criança filha de um fazendeiro adoeceu, doença grave. Tentou-se os recursos médicos da época sem resultados. Foi quando entrou em cena a mãe-preta, desesperada com a quase certeza da perda do "filho". Diz aos pais da criança que ia fazer uma promessa a São Benedito, pedindo pela vida do menino e que, se ele se salvasse, sairia como rei na festa dos escravos. Os pais, que a essa altura já estavam recorrendo a qualquer coisa que lhes desse uma esperança, aceitaram o compromisso. O fato é que a criança começou, logo em seguida, a sentir melhoras e, em poucos dias, estava inteiramente sã. O pai cumpriu a promessa da escrava e, ano seguinte, pela primeira vez, um menino branco foi o rei na festa dos negros. (MENDONÇA, 2011, p.01)

De acordo com Clarice Sarmento (2012), em matéria publicada no Jornal Norte de Minas, “Os trajes ostentam as cores do santo, azul e branco para N.S Senhora do Rosário, rosa para São Benedito e vermelho para o Divino (...)” (SARMENTO, 2012, p.3)
De maneira organizada e em fila indiana, com as vestimentas com as cores para o santo de devoção, saem às ruas do centro da cidade, fazendo suas coreografias e cortejos que desfilam com muito fervor, cantam e batem os tambores, fazem a maior festa na rua. Os grupos apresentam em seus trajes, utensílios que compõem as vestes de cada grupo, inclusive os Catopês. O utensilio que os caracteriza são: os capacetes cheios de fitas e miçangas coloridas, com pena de pavão, em demonstração de eminente criatividade. Sobre essa colocação, o autor acrescenta que “elementos importantes na organização indenitária dos Catopês são os capacetes, adereço enfeitado com fitas coloridas, miçangas, espelhos e pena de pavão.” (QUEIROZ, 2002, p.41). Os outros grupos também utilizam utensílios, como é o caso dos Caboclinhos que apresentam em suas vestimentas, as roupas que relembram os indígenas com objetos como o arco e flecha que bem os representa; a Marujada em que os participantes se vestem como os marujos de navios que, com suas espadas na coreografia mostram uma luta em um conflito.
Os grupos também têm o estandarte e o mastro com a imagem do santo, e na frente de cada terno é levada a bandeira do santo, sempre bem colorida e bem enfeitada, é com essas composições que eles saem em cortejo pelas ruas da cidade. De acordo com Ângela Martins Ferreira (2009) “Cada terno leva suas bandeiras (com o emblema dos santos que veneram) que são balançadas em rodopios marcantes a frente de seus ternos.” (FERREIRA, 2009, p.38)
Para os Catopês, Marujos e Caboclinhos, a coreografia faz parte do espetáculo e é através dela que os dançantes expressam toda a complexidade da festa, através do forte ritmo dos instrumentos que são tocados durante os desfiles ou na procissão. Pois, são nesses momentos que se vê a forte influência africana que os Catopés têm, nessa instância parecem sentir orgulho daquele universo e com todo prazer fazem a festa acontecer, esperando que o ano seguinte venha logo para promover novamente o festejo e reviver tudo mais uma vez. Conforme a autora, “os dançantes, no momento da consagração ajoelham demonstram sua fé no senhor Jesus, todos rezam o Pai Nosso com muita piedade.” (FERREIRA, 2009, p.53). O respeito com o sagrado é a forma de expressar a fé que os membros dos grupos possuem, é nesse momento de orações que eles revivem o que eles aprenderam, dessa forma passarão para seus filhos ou netos a tradição, não deixando esmaecer a festa na cidade de Montes Claros.
O domingo é o último dia de festa para os Catopês, Marujos e Caboclinhos, nesse dia é feita a procissão de encerramento. A procissão é mais um momento de mostrar a fé do povo e a união dos grupos da cidade e de grupos vizinhos de outras cidades que vêm para o encerramento da festa, a procissão começa na Praça da Matriz, passa pelas ruas do centro até a Igreja do Rosário na Praça Portugal e lá é celebrada uma missa de encerramento da festa. Nas palavras do autor:
A procissão acontece no encerramento da festa, domingo á tarde, com a participação dos outros ternos de Montes Claros e de outros grupos que estiveram no encontro dos grupos de congado. Esse evento inicia na Praça de Matriz, passando por ruas do centro da cidade sendo finalizado na Igreja do Rosário, onde acontece a missa de encerramento da festa. (QUEIROZ, 2009, p.50)

Ainda que o grupo de Catopês, Marujos e Caboclinhos seja secular na cidade, há lacunas no que diz respeito à data exata da primeira apresentação na cidade, por esse motivo, não temos datas específicas que comprovem algo com mais exatidão. Há documentos que comprovam datas posteriores às primeiras apresentações marcados no ano de 1939. Sobre isso, Hermes de Paula (2007) menciona:

A mais antiga noticia sobre o assunto é datada de 23 de maio de 1839, quando Marcelino Alves pediu licença pra tirar esmolas para as festas de Nossa Senhora do Rosário e Divino Espirito Santo que pretendia fazer nesta freguesia. (HERMES DE PAULA, 2007, p.138)

Assim é a festa dos Catopês em Montes Claros, cheia de composições agregadas à tradição secular. Foi essa trajetória dos Grupos que fez com que a cultura local fosse reconhecida, obtendo seu espaço, mostrando o valor que os Catopês representam para o município, dando um salto cada vez maior nas apresentações, hoje reconhecidas como patrimônio cultural e material da cidade. Sendo assim, Montes Claros abraçou a festa e os moradores da cidade sentem orgulho de ter esses festejos tão ricos em suas terras. Para a autora Ângela Martins, “nessas ruas, alguns moradores de famílias tradicionais ficam nos portões de suas casas. Comerciantes e funcionários à porta de suas lojas e o povo à beira das calçadas.” (MARTINS, 2009, p.32). Enfim, a tradição das apresentações dos Catopês na cidade gera cultura, conhecimento, entretenimento, uma infinidade de benefícios para o crescimento e desenvolvimento cultural do município, e se depender dos Mestres, essa tradição secular não vai morrer nunca. Sobre isso, finaliza a autora: “Muita gente veio de longe para conhecer e apreciar as Festas de Agosto. Os montes-clarenses que estão em outras cidades vêm matar as saudades desses dias festivos que ficaram gravados em suas memórias.” (MARTINS, 2009, p.32)

4. Considerações Finais

Conclui-se que o grupo dos Catopés na cidade de Montes Claros segue uma tradição religiosa que, ao celebrarem todos os anos as missas, primarem pelo levantamento de mastros, entoarem os de cortejos e os desfiles, revivem o que aprenderam com seus ancestrais e demonstram sua forma de expressão de fé e de devoção aos santos. Nas performances, eles buscam relembrar também o congado, que é a dança típica ou ritual de devoção aos santos, com características e ritos da cultura africana.
Os ternos de Catopês têm importantes características próprias, com roupas brancas, diferentes de outros grupos que se destacam pelas vestes azuis, rosas e vermelhas; todas as cores em homenagem aos santos, ainda em sua composição os Catopês possuem os capacetes sempre bem enfeitados com fitas coloridas, miçangas e penas de pavão, tudo para agradar o santo de devoção. O objetivo maior dos enfeites e das roupas é levar alegria ao povo, demonstrando fé e devoção aos santos que, para eles, são os donos da festa, tudo é feito em nome deles.
O grupo segue uma tradição que foi passada de geração a geração. Nessa tradição, revivem-se todos os anos os momentos distintos que expressam os valores na crença que o grupo tem na festa, algo que ao longo do tempo foi-se passando e até chegar aos dias de hoje, de lá até hoje são mais de cem anos, fazendo do passado um momento histórico utilizado no presente que se prepara sempre para o futuro.
O objetivo do trabalho foi desenvolver e mostrar a riqueza que é o patrimônio cultural que Montes Claros tem: os Catopês. Com eles, podemos ver a religiosidade e a cultura juntas dando um salto grande à sua própria valorização, sem deixar enfraquecer a história que é revivida ano após ano. A tradição do grupo Catopês é um exemplo da necessidade de se preservar o passado em sua diversidade, convertendo-se em algo de bastante valia para uma cidade. O trabalho tem ainda o objetivo de fornecer informações que agregam a religiosidade, a cultura e a preservação do patrimônio da cidade, para que o grupo dos Catopês possa somente crescer como o que tem feito ano a ano, independente das dificuldades encontradas ao longo da caminhada secular na cidade, sempre respeitando o divino e o sagrado amplamente representado nas três divindades e no senhor Jesus Cristo, mentor de tudo e de todos.
Temos uma diversidade de indicações para trabalhos futuros: os momentos; as composições que têm uma grande extensão dentro do grupo; os cantos; as músicas, junto dos seus instrumentos com o qual fazem um verdadeiro espetáculo. A relação que o grupo de Catopês tem com a Secretaria de Cultura e com a prefeitura da cidade de Montes Claros, como eles decidem a data, como funciona o setor financeiro dos grupos são temáticas com muitos desdobramentos.




5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BRAGA, Márcia. O Folclore e as Festas de Agosto em Montes Claros. Editora Secretaria de Cultura, Montes Claros, MG, p.01-05, 2002.
Cadernos de Agosto, Montes Claros, MG, editora Unimontes, p.01-02, 2004.
CALIXTO, Benedito. Ponto de Cultura, Cultura Ativa, 2011.Disponível em: . Acesso em 13 de Nov.2012.
CARVALHO, Valdemar Ferreira de. O poder do imaginário popular. Disponível em: . Acesso em 06 de junho de 2013.
FERREIRA, Ângela Martins. Festas de Agosto, Fatos, Fotos e Fitas. Montes Claros, MG, 1ªed,  p.09-58, 2009.
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MENDES, Jean Joulat Freitas. Músicas e Religiosidade na Caracterização do terno dos Catopês de Nossa Senhora do Rosário do Mestre João Farias em Montes Claros. MG, editora Unimontes, p.127-132, 2004.
MENDONÇA, Raquel. Arte e Cultura, outubro de 2011. Disponível em: . Acesso em 13 de Nov.2012.
ORIÁ, Ricardo; BITTENCOURT, Ciro. O sabor histórico na sala de aula. Memória e ensino de história. 10ª ed. São Paulo, p. 128-146, 2009.
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PEREIRA, Marcelo. 6º Encontro com o Folclore, Festa do Rosário. Disponível em: . Acesso em 13 de Nov.2012.